Ser jovem e não ser revolucionário é uma contradição genética. Che Guevara

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

“Enquanto caminhava a caminho de casa, lembrando da tarde em que estive junto com a pessoa que eu mais amava neste mundo, com fones em meus ouvidos, vejo um vulto branco e barulhento passando a meu lado e parando na casa dele. De repente meu coração parou quando lembrei o porquê do meu encontro ter chegado ao fim: ele estava se sentindo cansado e estranho. Entrei em pânico. Os médicos haviam dito a ele que tinha possibilidade de vários anos a frente ainda! Não pode ser verdade. Sai correndo em direção a grande casa a qual tinha estado na noite do outro dia, tropecei algumas vezes, e caí a aproximadamente a 50 metros da grande ambulância do pronto socorro da cidade, ficando no chão, sem forças para levantar, quando vi ele, meu anjo de cabelos pretos lisos e olhos verdes. Havia algo de errado. Ele estava muito pálido, e parecia que recém tinha voltado de um jogo de futebol, de tanto suor que estava acumulado em sua testa e na mesma camisa azul escura que ele utilizara na mesma tarde. Eu continuei no chão, até ver o pai dele saindo abruptamente pela casa. Ele me olhou, correu até mim e me levantou dizendo

- Esta acontecendo esperávamos, Alice. Venha comigo para o hospital, por favor.

Entrei no carro e ambos ficamos calados até chegarmos ao hospital. Continuamos em silencio na sala de espera. Eu estava caminhando de lado a lado da sala, roendo minhas unhas, mexendo em meu cabelo, esperando o veredicto do médico. De repente, um homem de mais ou menos 40 anos e de jaleco branco adentra a sala de espera e fala:

- Conseguimos estabilizar o Raphael, mas ele ainda corre risco, ainda mais por estar sofrendo de Leucemia a muito tempo. Seu corpo está cansado de tentar vencer a batalha...

Se eu estava quase chorando só de esperar, neste momento eu não agüentei. As lágrimas irromperam meus olhos, escorrendo lentamente, mas em grande quantidade por meu rosto.

- Posso ver-lo, Doutor? – Perguntei, dentre soluços.

Ele acenou com a cabeça afirmativamente e pediu que eu o seguisse. No caminho, segurando a mão do pai do Raphael com minhas duas mãos, disse:

- Ele é forte, já passou por algumas antes. Vamos sair dessa.

Ele estava chorando, mas não era por causa do meu discurso, mas sim por que viu em meu dedo anular da minha mão esquerda, um delicado anel com uma pedra vermelha Rubi e uma pedra negra Ônix, por dentro, com as escrituras: “Amá-la-ei mesmo depois de morto”. Era meu anel de noivado, recebido na noite anterior. Não creio que Raphael tenha contado ao pai sobre nosso projeto, nem eu havia contado aos meus. De repente, meu futuro sogro me abraça, fortemente e diz:

- Você é a melhor coisa que já aconteceu a meu filho.

Ele pôs as mãos em meus ombros, como se procurasse apoio.

- Eu amarei seu filho mesmo depois da morte, assim como ele também irá me amar.

Abraçados, caminhamos pelo corredor branco do hospital. À dois quartos de onde Raphael estava, ouvi um tipo de apito de monitor. O apito de monitor que demonstrava a falta de batimentos cardíacos. Sai correndo até o quarto de meu amor, e lá estavam mais ou menos 3 médicos e 2 enfermeiras tentando reviver-lo. Ele estava respirando por ajuda de aparelhos, com uma enfermeira monitorando-os, outra fazendo massagem em seu peito, e os médicos tentando manter seu coração batendo. Até que o mesmo médico que falou conosco na sala de espera quase gritou:

- Já chega! Tentamos o bastante, e a parada já dura muito, o cérebro está sem receber oxigênio por muito tempo. Vamos parar e declarar óbito.

Todos os médicos e enfermeiras me viram arfar, ajoelhada ao chão, branca feito neve e provavelmente com o meu coração parado, assim como meu amado.

- Óbito às 20h32min.

Juntei todas os pequenos fragmentos de força que me restavam e me levantei. Caminhei até o corpo sem vida de meu noivo, toquei seu rosto e todas as nossas lembranças vieram a minha cabeça: a primeira vez que o vi na escola, primeira conversa que tivemos, primeiro encontro, primeiro beijo, primeira noite de sexo, o ultimo beijo, ele escrevendo em meu caderno a luz do por do sol, o sorriso dele acompanhado de lágrimas quando me pediu em casamento e eu disse que sim, sua ultima palavra para mim que foi “Cuide-se”, e enfim, seu corpo, pálido, sem vida, sem oxigênio, vencido de uma batalha de vários anos contra células anormais em seu sangue. Uma batalha árdua, perdida com dignidade.

Não ouvia o que os médicos me mandavam fazer, se me mandavam embora, ou se simplesmente haviam se retirado da sala para dar a mim e ao pai de Raphael um momento para se despedir. Eu também nem sabia se ele estava ali. Estava apenas a olhar o meu anjo, meu anjo da guarda. Estava apenas a memorizar suas feições perfeitas. Virei a cara. Não gostaria de lembrar dele daquele modo. Extremamente suado, com sua camisa meio aberta, meio rasgada, totalmente manchada de suor. Não conseguia mais ficar ali. Me retirei da sala silenciosamente ao perceber que meu sogro estava ajoelhado no outro lado do corpo de seu filho morto. Acabei por sentar na sala de espera, com o mesmo caderno que Raphael passou quase uma hora escrevendo algo, no colo. Ele havia deixado uma carta para mim, e nela estava escrito:



À minha querida Alice.

Meu amor, todos sabemos que não me restam mais de 2 a 6 anos de vida, e eu sei que, por alguma disfunção em seu cérebro, você me ama tanto quanto eu amo você. E sei como você tem saudade das coisas, e é sensível, então, vou lhe deixar esta carta, um dia após eu lhe pedir em casamento, para sempre que se sentir mal, triste, com saudade ou qualquer sentimento o qual eu não possa estar aí para te abraçar e beijar.

Eu te amo, mesmo após de morto, sempre amarei. Você foi minha salvação, minha benção...



Nunca consegui terminar de ler esta carta. Mas sei, que meu anjo Raphael sempre me amará e estará me cuidando, seja lá onde ele estiver.”


Érica Barros

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